Thursday, October 30, 2014

Do vestir-se [versão infantil]

Uma das coisas em que não tinha reparado nas minhas visitas e estadia de um ano aqui no Porto é o como as crianças se vestem (ou são vestidas, para ser mais exata). Talvez, claro, por não ser mãe ainda e eu mesma pouco me importar, exceto nas ocasiões que tenham um código de vestimenta, com o que pensam das minhas roupas. Eu não me visto totalmente mal, mas há muito tempo que não me visto bem. Eu me visto como posso, mas para os padrões portugueses - que são semelhantes aos brasileiros - acho que atraio eventuais olhares de reprovação.

A minha filha nasceu e passou seus dois primeiros anos de vida na Inglaterra, onde a questão da moda, adulta e infantil, é muito liberal, com exceção de alguns lugares esquisitos como aquele onde morei e em que sempre recebia olhares de cima a baixo quando chegava a um evento ou reunião de conhecidos (bom, mas se até o meu tapete recebeu uma inspeção quando pensaram que eu não estava atenta...). Talvez pela maldade do clima, as crianças são estimuladas a enfrentar os elementos, a interagir com materiais orgânicos (o que não inclui dejetos de animais, não se preocupem), a não terem frescuras, pois do contrário ficavam só trancadas em casa e alienadas do mundo. Para ter uma ideia, um dos grupos de atividades do centro de recreação infantil que ela frequentava chamava-se "Let's get messy" ("vamos nos sujar!"). Diz o meu pai, como dizem várias pessoas "das mais antigas" (o que não certifica isto como fato científico, vale dizer, parece que é balela), que mexer na terra, areia, etc, ajuda a fortalecer o sistema imunológico [imunitário], portanto nunca me preocupei muito (só um pouquinho, vai!). Foi esse o clima do início da vida da pequenota - inclua aqui o fato de termos um jardim semi-selvagem no quintal, que ela adorava explorar.

Portanto, a maioria das roupas da minha filha são o que se chama de "roupas de bater", ou seja, práticas e para serem sujadas, baratas sem serem de péssima qualidade, não para controlá-la a fim de não estragar o visual de boneca (mas, claro, ela tem uns outfits mais arrumadinhos para ocasiões que exigem). Eu não estou a criticar quem veste os filhos todos matchy-matchy, se o seu orçamento permite e o estilo de vida exige, se o seu gosto é por visuais de vitrine, quem sou eu para julgar. Mas a minha filha certamente não é uma criança que se encaixa no perfil de menina quietinha e bem vestida. Ela gosta de terra, areia, pedras, grama [erva]. Assim que vê um pedacinho de natureza, literalmente se joga. Ajoelha-se, coleta, leva coisas à boca (sob nossa supervisão, claro), quer tocar, sentir. Sapatinhos azul-marinho envernizados com meias da mesma cor (é uma tendência? vejo tanto!) seriam detonados na primeira ocasião. E isso não se aplica apenas ao mundo exterior; nos parques infantis dos shopping centers, por exemplo, ela gosta é de sentar no chão. Sem mencionar os cabelos - não gosta que lhe toquem nas madeixas, arranca fivelas [ganchinhos] e elásticos, passa comida na franja, laçarotes e golas de Camões são utopia. Outro dia, no ônibus [autocarro], tive de ouvir comentários de que ela estava despenteada e com calor (era o dia do meu aniversário, ela estava arrumadinha, mas saímos de casa com céus cinzentos e promessa de chuva, mas o tempo virou e fez calor o dia inteiro) - a senhora, que disse isso à neta, pensou que não falávamos português, mas eu logo deixei claro que tinha entendido as palavras tão agradáveis.

Se dou uma saída rápida com ela antes do banho, muitas vezes não enxergo o quanto ela está encardidinha das brincadeiras do dia (o andar de baixo da casa que arrendamos é bem escuro, não vou deixar os estores escancarados o tempo todo); ou se estamos de retorno de uma ida à praia e paro para fazer compras, por exemplo, não é incomum eu ver, diante da iluminação inclemente dos supermercados, que ela está num estado calamitoso (dou uma espanada geral, mas prefiro banhá-la só em casa, a não ser que esteja muito suja). Fico um pouco constrangida porque começo a reparar nos bebês e crianças ao meu redor e estão sempre impecáveis e me pergunto como as outras mães conseguem; acho as outras crianças tão comportadas e que devo dar a impressão de que sou desleixada. Eis algo com que eu definitivamente não me preocupava, ou notava, na Inglaterra.

Li este post ontem, que tem um pouco a ver com o assunto e que coincidiu com essa reflexão. Espero que a minha filha não seja excluída se continuar a ser assim, de um jeito mais natural, do jeito dela. Espero que essa liberdade e descontração, um pouco julgadas, resultem em algo bom.

4 comments:

  1. Querida Dani, não ligues. A sério. Aqui as pessoas são muito obcecadas com a aparência, com o "estar bem apresentado" e adoram julgar os outros, é o passatempo nacional. Não ligues, vai haver sempre quem critique a forma como educas a tua filha, quem deite um olhar reprovador às tuas roupas, eles que se lixem.
    Bjs

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  2. A tua filha vai ser uma menina maravilhosa :) A liberdade não pode fazer mal a ninguém.
    Bjs

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  3. Olá Dani,
    As pessoas dão valor e preocupam-se com as coisas que na verdade não interessam, e com o que realmente importa são do mais negligente que há!! No outro dia vi uma menina mais pequenina que a minha (devia ter pouco mais de um ano), a comer um chupa-chupa!! Deviam-se preocupar mais com o que os seus filhos comem do que o que vestem!!
    beijinhos do Paraíso "-"

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  4. Olá :) Obrigada pelo apoio! Pois, vemos crianças comerem coisas muito pouco apropriadas à idade. Oferecem coisas à minha que ela ainda não come - ela come mal, portanto mais do que nunca prefiro não experimentar coisas muito tentadoras, aí que ela não quer mais comida "normal". Vi uma mãe, outro dia, dar um copão de Coca Cola à filhinha de cerca de dois anos ao mesmo tempo que tentava convencê-la de tomar a sopa. Eu entendo as artimanhas que se emprega diante do desespero de tentar fazer uma criança comer - muito bem! -, não dou tudo super saudável porque às vezes tenho de fazer concessões para que ela simplesmente coma, mas...
    Um beijo!

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