Tuesday, June 10, 2014

Enquanto isso

E neste arruma-arruma, joga isso fora, coloca aquilo na ebay, separa para doar às lojas de caridade, eu fico stressada. Demais. O empacotar não me preocupa, é um processo mais direto. É a preparação que acaba comigo, são as pequenas decisões a serem tomadas várias vezes ao dia. É o receio de colocar certas coisas no caminhão de mudança e nunca mais vê-las.

Como mencionei antes, já cometi erros em mudanças, perdi objetos importantes, tive de me desfazer de coisas às pressas. E já mudei de país quatro vezes: Brasil-Inglaterra-Portugal-Inglaterra. É a quinta e, nem por isso, mais fácil. Tenho agora a ansiedade adicionada de ter de resolver o destino dos pertences de V.

A questão é que ontem percebi que o meu stress não é aparente, eu não fico a pensar muito nisso. Eu passo o dia calma, faço tudo de forma um pouco caótica, mas sem perder a pose. Daí, num momento inesperado, quando estou a descer as escadas, sinto um aperto no peito, uma ligeira falta de ar. Ou acordo no meio da noite, tremendo. Ou seja - eu sufoco o stress, e ele me pega desprevenida. Eu tento afugentá-lo, mas é uma luta praticamente inútil, porque a causa está arraigada demais. Um dos motivos de estar a seguir o regime alimentar que sigo é ajudar na gestão do stress, que me faz imenso mal. E não é só comida, são também os os suplementos alimentares, os chazinhos, o calmante natural que tomo três vezes ao dia. Foi-me recomendada a ioga, mas nem por isso. Quando e como?

O que percebi ontem também que não são as coisas em si, mas o que elas representam que me causam angústia. Eu olho para uma caixa de cartões de aniversário e de Natal e quero colocar tudo no lixo. É a minha vontade. Mas sei também que, uma vez ou outra, vou reler esses cartões, que serão um travesseiro confortável no final de tudo. E isso me paralisa.

O meu problema, portanto, não é o apego aos objetos, mas ao seu significado. É a minha mania de atribuir esse tal significado a quase todos os objetos. São as perdas que sofri que me deixam nesse constante estado de ansiedade e receio de ver tudo ruir de uma hora para outra, que me fizeram buscar segurança em coisas.

E tem também o elemento "medo da mudança". Porque é algo que quero há tanto tempo que não sei muito bem o que fazer agora que está a se concretizar. Medo de ter sido tudo apenas uma grande teimosia minha.

Não é fácil descobrir tudo isso às três horas da tarde, ter o insight do problema mas não o da solução. Que ele venha também.

6 comments:

  1. Querida Dani,
    é perfeitamente normal ter milhões de dúvidas e inseguranças quando se encara uma grande mudança de vida. Não te angusties com os medos. Certamente alguma coisa vai ficar para trás, mas o essencial vai contigo, a tua família e as tuas vivências. Logo, logo terás novas coisas e novos sentimentos/lembranças associados a elas.
    Bjs

    ReplyDelete
    Replies
    1. É verdade, Isabel. O essencial vai connosco, tenho de repetir isso como mantra :)
      Obrigada pela força, beijinhos!

      Delete
  2. Sei bem o quanto se pode tornar sofredor atribuir significados a todas as coisas, tornando-nos prisioneiros delas. Não é possível mudar de um dia para o outro, mas há que fazer um esforço, para bem da nossa saúde mental. : )

    ReplyDelete
    Replies
    1. Sim, Alexandra, é um aprendizado lento, mas que espero alcançar num tempo não muito distante.
      Muito obrigada pela visita e pelas palavras gentis!
      Um abraço,
      Daniela

      Delete
  3. Olá Dani :)
    Eu sou a pior pessoa para vir aqui botar discurso. Desfaço-me das coisas com uma facilidade assustadora. Mate guarda tudo, eu deito fora. Sempre foi assim e acho que com a morte do meu pai (que deixou toneladas de papel sem destino, entre outras coisas) ainda me tornei mais despojada. Quase doentio. Uma necessidade, recorrente, de me desfazer (ou reconverter) do que não tem utilidade.
    Depois também há o reverso da medalha. Há dias, na garagem encontrei uma caixa de linhas (enorme, que estava na loja do meu pai) e que agora teimei em recuperar.
    Tenho o meu caixote com cartas, cartões de aniversário, bilhetinhos. Esses, guardei-os sempre. Gosto de os reler de tantos em tantos anos ou numa ocasião especial.
    Quando vim para a Figueira, creio que me desfiz de metade do recheio da minha casa de Lisboa. Quando saí de Chaves, dei todos os móveis que tinha comprado para lá viver (também não conseguia enfiá-los no carro!).
    Talvez o que te esteja a stressar nem seja o processo de escolha do guardar ou deitar fora, mas sim a mudança e os medos (absolutamente naturais) associados a ela. Os objectos podem estar a funcionar como bóias de salvação perante o desconhecido que acompanha todas as mudanças.
    Escolher meia dúzia de objectos com um significado particular e que possam representar todos os outros objectos "menores" também pode ser uma ajuda.
    Vai correr bem! A vida resolve-se sozinha. Vai mesmo correr bem!
    Beijinhos!

    ReplyDelete
  4. Olá :)

    Obrigada pelas palavras :) É bom ler, ouvir coisas assim, de ti e das outras que comentaram, funciona como estímulo.
    Eu nunca tive muitos problemas em me desfazer de coisas, antes de vir para a Inglaterra fiz uma limpeza geral em tudo e, sempre que comprava algo novo, como roupas, por exemplo, doava algo para compensar e não acumular.
    É algo mais recente.
    Acho que é mesmo uma questão de projeção sentimental e de medos e ansiedades, não tenho dúvidas. Eu gosto de um estilo mais minimalista, mas às vezes me lembro de algo que doei e sinto uma pontada de arrependimento. Mas sei, tenho de relativizar, nada é para sempre e as coisas são só coisas, não são preciso cem, mas apenas algumas com valor simbólico, pois senão a vida vira um museu de coisas que nos possuem.
    Beijinhos, obrigada pela força!

    ReplyDelete