Monday, September 16, 2013

A mesa

Eu não escolhi a mesa, ela já estava ali. Vivia num canto, fazia a função de aparador. Até o dia em que preparei um almoço de Natal e resolvemos estendê-la. De bom tamanho sim, mas só comportava quatro cadeiras ao redor, o suporte era todo enviesado. Trouxemos a mesa para cá, eu não queria. Mas como nos mudamos na pressa e ela cabia na cozinha, aberta, ficou por isso mesmo. Resolvi que a mesa seria um projeto - que seria lixada, restaurada, que se tornaria mais clara e teria assentos listrados. Era um trabalho para a primavera, já que tudo isso teria de ser feito no quintal e eu não sou pinguim.

Mas a seguir veio a gravidez, a primavera demorou a emplacar, tinha de trabalhar, fiquei mal fisicamente e o pouco entusiasmo - e talento - que eu tenho pelos trabalhos manuais se perdeu na lista das outras dez mil coisas a serem resolvidas e preparadas.

A mesa é feia, é escura. Gosto das cadeiras, mas o estofado é antiquado, e não de um jeito "vintage" charmoso. É tristonho. De um tempo para cá, a mesa assumiu novas conotações - é agora um objeto perigoso, já que o "suporte enviesado" não tem um encaixe real, e pode ser deslocado por uma menininha de um ano que está aprendendo a andar e adora se enfiar embaixo dela. E fazer metade do tampo cair sobre a sua cabeça. Eu finalmente desisti da mesa, e ela parece ter desistido de nós. Começou a descascar de um jeito muito deselegante, e custa-me olhar para ela.

Subsititui-la é fácil, a loja enorme de artigos de segunda mão entrega a "nova" e leva essa tranqueira. Não, eu não faço a mínima questão de uma mesa nova em folha, contanto que eu goste do modelo e esteja em bom estado, por que não? Nada nesta vida fica com aparência de novo eternamente, e as pessoas se desfazem de móveis de ótima qualidade sem pestanejar. Eu até gosto que tenham uma marquinha ou outra do tempo. Wabi-sabi.

Pois, é fácil me livrar dela. Mas porque estamos numa época de transição, talvez geográfica, algo tão simples assim se torna uma decisão difícil. Mas eu quero a mesa fora daqui. Tanto quanto quero ir embora.

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